No alto da serra, a 120 quilômetros de João Pessoa, a decisão foi tomada por telefone. A produção de álcool desinfetante já estava pronta e a ligação era a última esperança de Thiago Baracho chegar ao alto escalão da AGEVISA, a Agência Estadual de Vigilância Sanitária da Paraíba.
“Vou arriscar as penalidades, mas não vou deixar o hospital descoberto. Farei a doação de toda forma!”, disse o presidente da Associação dos Produtores de Cachaça de Areia, antes de encerrar o contato.
Naquela semana, o Estado da Paraíba ainda não tinha casos registrados de Coronavírus, mas a situação já era de emergência. No pequeno município, de 23 mil habitantes, faltava álcool em gel e produtos de higienização para os profissionais de 10 unidades de saúde e o hospital da cidade. Mesmo com um adicional de 25% na licitação, a prefeitura não conseguia atender a demanda.
Uma situação parecida com a de muitas cidades pelo país e ao redor do mundo, após a pandemia de Coronavírus promover uma corrida às compras e esgotar os estoques desses produtos.
Em meio a tantas notícias preocupantes, o Instituto Brasileiro de Cachaça (IBRAC), sediado em Brasília, fez um pedido para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Uma autorização, em caráter emergencial e excepcional para produção, envase e transporte de álcool desinfetante para produtores de cachaça.
Momentos excepcionais pedem medidas excepcionais e a ANVISA acatou o pedido. Por meio de nota técnica flexibilizou as normativas para facilitar a produção e distribuição, incluindo doações, de produtos a base de álcool (álcool gel, álcool etílico 70% e álcool isopropílico 80%).
Carlos Lima, diretor executivo do IBRAC contou que a entidade se inspirou no movimento que outras bebidas alcoólicas fizeram internacionalmente, além de iniciativas como da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA) e de outras empresas do Brasil. “Houve do setor um cuidado muito grande em fazer esse processo com o máximo de segurança possível”, explicou.
MEDIDAS: |
1- Disposição de responsável técnico, regularizado no Conselho de Classe, para supervisão da produção; |
2- Atendimento à todos os requisitos de segurança para o armazenamento, manipulação e transporte de Álcool 70% INPM; |
3- Atendimento aos requisitos técnicos de qualidade e segurança das matérias-primas; |
4 – Rotulagem padrão (constando Razão Social, CNPJ, endereço, telefone do estabelecimento, validade, concentração do álcool, indicação de uso, formulação qualitativa completa e as advertências); |
5 – Comunicação da produção e doação à Vigilância Sanitária Estadual ou Municipal. |
O ARQUIVO COMPLETO PODE SER ACESSADO AQUI |
Em muitos casos, os produtores de Cachaça são também produtores de aguardente de cana e destilado alcoólico simples de cana de açúcar com teor alcoólico superior a 54%. O álcool doado pode ser produzido a partir da retificação do destilado alcoólico, sendo o produto final padronizado a 70%.
Em outros casos, os produtores também possuem conjuntos de destilação apropriadas para a obtenção do álcool etílico hidratado. Para esse processo, podem ser utilizadas frações residuais da produção de Cachaça.
Algumas empresas também possuem em seu portfólio bebidas alcoólicas mistas e outros produtos que são produzidos a partir do álcool etílico potável (a 96% vol.) que também atende todas as normativas vigentes. Neste caso a doação é de álcool etílico potável padronizado a 70% vol.
Existem também empresas que estão disponibilizando suas instalações para o envase de álcool doado por outras empresas.
O IBRAC reforça ser de extrema importância que o produto final atenda o previsto na nota técnica da ANVISA e, também, demais legislações vigentes. Evitando eventual contaminação ou mau uso que porventura coloque em risco a elaboração de bebidas sob controle do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). As empresas também devem adotar as devidas medidas de cautela, interrupção do processo e regular saneamento após a produção de álcool 70% INPM.
Nas últimas semanas, uma corrente de apoio se formou no país para garantir o mínimo de proteção aos profissionais de saúde que estão na linha de frente da luta contra o Coronavírus. E grande parte desses esforços vieram da indústria de bebidas.
Em momentos de crise como o que estamos passando, trancados em casa, com a economia em baixa, comércios fechados, empresas à beira do colapso, redução de renda e sem perspectivas a curto e médio prazo, atitudes como a dos produtores de cachaça trazem esperança. E ações, como a do IBRAC, garantem segurança jurídica ao setor.
Encontrar formas de ajudar o outro estimula um sistema de recompensas no nosso cérebro. Diversos estudos já mostraram que doar é uma via de mão dupla: faz bem à quem recebe e também à quem oferece. É uma sensação quase como a de tomar um copo da sua bebida favorita ao final de um longo dia de trabalho. E não importa o quanto tem no copo, a recompensa é a mesma.
E esse apoio vai além dos hospitais. Empresas e companhias têm se unido na luta para mitigar, também, alguns dos efeitos devastadores da pandemia para o setor.
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