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ReporO historiador e folclorista, Câmara Cascudo, em seu livro “A História da Alimentação no Brasil” defende que comer é um ato orgânico que a inteligência tornou social. Beber (álcool), por sua vez, é antes de tudo um ato social e cultural, uma vez que as bebidas alcoólicas não são essenciais à nossa sobrevivência.
As bebidas alcoólicas evidenciam relações humanas, são guiadas por protocolos e regras de consumo consciente e, normalmente, consumidas coletivamente. Bebemos de acordo com a sociedade em que vivemos e isso nos ajuda a compreender transformações do mundo à nossa volta.
Apesar dessa longa relação com o álcool, ainda não sabemos definitivamente o que essa molécula simples é capaz de fazer em nossos corpos. Embora as razões pelas quais nos convencemos de que beber uma taça de vinho, um copo de cerveja ou um cálice de cachaça, após um dia estressante de trabalho, pareçam muito válidas e irrefutáveis, a Organização Mundial da Saúde (OMS) pediu uma redução de 10% no uso per capita de álcool até 2030.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda que adultos saudáveis não consumam mais de duas doses padrão de álcool por dia, o que equivale a cerca de 30 gramas de álcool puro. Além disso, a OMS recomenda que se tenha pelo menos 2 dias sem consumo de álcool por semana. Essas recomendações são para ajudar a reduzir o risco de problemas de saúde relacionados ao consumo excessivo de álcool, como doenças hepáticas, câncer, acidentes de trânsito e violência. No entanto, a OMS enfatiza que, apesar de recomendar um consumo consciente, há melhor opção é não beber álcool.
A noção de que beber moderadamente traz benefícios para a saúde começou com os estudos populacionais da década de 60. No livro “Meu doutor, o vinho: os grandes benefícios para sua saúde”, recentemente publicado, o médico nutrólogo Wilson Rondó Júnior faz um percurso histórico para mostrar as evidências científicas acumuladas ao longo dos anos que estariam associadas à composição das bebidas. A obra propõe o vinho como alimento, desde que em “posologia médica”, adverte o autor.
Entre os mecanismos que beneficiariam a saúde estão propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias dos polifenóis conhecidos como resveratrol, quercetina e antocianina, que contribuiriam para atenuar fatores de risco cardiovasculares e de outras doenças.
Compostos fenólicos, fornecidos pela madeira usadas no processo de envelhecimentos de diversas bebidas alcoólicas, possuem propriedades antioxidantes e anticoagulantes. Quanto maior for o contato da bebida com a madeira, maior a extração e concentração desses compostos, e consequentemente, mais benefícios para a saúde. Diversos fenóis simples e polifenóis são encontrados, por exemplo, em cachaça envelhecida, principalmente os elagitaninos, derivados de taninos hidrolisáveis da madeira.
Os polifenóis possuem capacidade anticoagulante que reduz o acúmulo de plaquetas no sangue e protegem contra doenças coronárias e câncer. A ação antioxidante favorece mecanismos de defesa do organismo e combatem fatores oxidantes, tais como radicais livres e o LDL (colesterol ruim).
Vários estudos publicados durante meio século (1960 e 2010) associam o consumo consciente com um moderado de bebidas alcoólicas. Mas foi a partir da década de 80 que o chamado “paradoxo francês” chamou a atenção dos cientistas.
Os pesquisadores buscavam explicação para a baixa taxa de mortalidade por doenças cardiovasculares na população francesa que era altamente tabagista e reconhecida por abusar das gorduras saturadas. Nessa relação, apareceu o vinho, mas as evidências coletadas sugerem propriedades cardioprotetoras também do álcool contido em outras bebidas, como a cerveja e a cachaça.
Os polifenóis da cerveja, por exemplo, demonstraram ações antioxidantes, anticarcinogênicas, anti-inflamatórias e antivirais em estudos in vitro (modelos celulares). Outras pesquisas encontraram associações entre o consumo moderado de destilados e menor risco de diabetes. É preciso ter em mente que alguns desses resultados podem também estar associados a hábitos mais saudáveis e alimentação balanceada encontrados na Europa, onde grande parte dos estudos foi feita.
Avaliar os efeitos do álcool na saúde tem sido um grande desafio devido à carência de pesquisas de longa duração e muitas vezes os resultados divulgados na imprensa parecem bem contraditórios. É preciso lembrar que o álcool é uma substância psicoativa com propriedades que causam dependência e em altas doses é, sim, tóxico para o organismo.
Desde 2010, a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer classifica o etanol como carcinogênico para os humanos. A Organização Mundial da Saúde afirma que os pequenos benefícios adquiridos com o consumo baixo e moderado são superados pelo risco aumentado de outros danos relacionados à saúde.
Um estudo global, publicado na revista científica The Lancet, em 2018, afirmou não existir um nível seguro para o consumo de álcool. E no final de janeiro de 2021, a Federação Mundial do Coração ratificou a informação ao publicar um guia, no qual diz que nenhuma quantidade de álcool é boa para o coração. Isso sem contar as inúmeras mortes que são associadas ao consumo e ao abuso do álcool.
O médico cardiologista, Pedro Cellia, em estudo recente apresentado na American Heart Association, acompanhou 40 indivíduos saudáveis para comparar o consumo de vinho e cachaça em dose moderada. O resultado do estudo clínico foi um tanto desanimador para quem busca evidências de algum benefício à saúde. Além de não mudar significativamente nenhum dos parâmetros analisados – ligados à aterosclerose ou o envelhecimento dos vasos sanguíneos -, as pessoas que consumiram vinho ainda engordaram.
Esse, de fato, é um assunto extenso (e polêmico), com muitas variáveis e paixões envolvidas. A melhor maneira de saber se existe uma quantidade segura para o consumo consciente de álcool é seguir lendo e pesquisando. Afinal, as teorias científicas sempre estão em processo de seleção e aprimoramento. São como os ajustes que precisamos fazer para acertar as lentes de um novo óculos em busca da nitidez.
Até lá, para quem o alerta de abstinência não é uma opção, o consumo consciente já deverá trazer resultados observáveis no curto, médio e longo prazo. Por isso, se for beber, que seja com moderação.
Referências:
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