Avaliar ou degustar cachaça é uma arte que requer metodologia e um vocabulário para descrever nossa percepção sensorial. Já falamos sobre as cores da cachaça. E também sobre seus principais aromas. Para continuar ajudando com essa tarefa, mapeamos as principais sensações que podemos sentir durante esse prazeroso processo (ou nem tanto assim).
Consideramos positivas as sensações aveludada, boca cheia e frescor. Se em equilíbrio, ou seja, quando a sensação não se sobressai em excesso, são bem- vindas também picante, adstringente, aberta, agreste, fechada e metálica. Já queimação e sem corpo não são sensações agradáveis.
A sensação amadeirada está sempre presente em cachaças que estagiaram em madeira e geralmente agrega aromas, sabores e novas sensações, principalmente acompanhada da sensação aveludada. O etanol caracteriza a sensação alcoólica e é condutor importante das outras características sensórias dos destilados.
Quando usamos a famosa expressão “desce redondo”, o que se pretende comunicar é que a sensação é muito prazerosa – a cachaça não agride as narinas durante a análise olfativa e não desagrada boca, língua e mucosas durante a análise gustativa e de retrogosto. É perceptível em cachaças equilibradas, sem que um aroma ou sabor se sobressaia de forma desarmônica. No exame gustativo, geralmente a sensação está associada ao corpo da cachaça, ou seja, à percepção de viscosidade do destilado na língua. Cachaças aveludadas geralmente envelheceram em madeira por mais de um ano. O envelhecimento em barris porosos favorece a micro-oxigenação, quebrando os taninos da madeira e tornando essa sensação muito perceptível.
As cachaças sem corpo podem até ser agradáveis no nariz, mas, durante a análise gustativa e de retrogosto, desaparecem rapidamente. Essas cachaças têm baixa viscosidade e não deixam vestígios logo após a ingestão, caracterizando uma bebida sem personalidade. A sensação está presente geralmente em cachaças muito diluídas em água e sem equilíbrio entre sensação alcoólica e amadeirada. Uma amostra muito amarelada e viscosa na taça, mas sem corpo, pode significar adição de caramelo e glicerol, o que indica baixa presença de compostos naturalmente adquiridos durante o envelhecimento.
Sensação de queda de temperatura na boca, como ao mascar uma folha de hortelã, observada no exame gustativo e de retrogosto. É bastante perceptível em cachaças que envelheceram em madeiras que aportam notas de especiarias, como o bálsamo, rico em eugenol. O álcool também contribui para a redução da temperatura corpórea, aumentando a circulação e trazendo maior sensação de frescor.
Sensação apimentada, análoga à ingestão de uma pimenta fraca, constatada durante o exame gustativo e de retrogosto. Se em equilíbrio, é muito agradável e se mantém na boca depois de alguns segundos após a ingestão da cachaça. Podem-se notar na língua leves formigamentos por alguns segundos. É percebida facilmente em cachaças envelhecidas em barris com características da família das especiarias, como amburana, carvalho, bálsamo e canela-sassafrás.
Caracteriza-se pela sensação de secura na mucosa oral e pela ausência de salivação durante o exame gustativo. É possível comparar com a sensação causada ao mastigar certas frutas ainda verdes, como banana. As cachaças brancas com características da família dos vegetais podem trazer essa sensação. Os taninos fornecidos pela madeira durante o envelhecimento também são responsáveis pela adstringência.
Comparada com a sensação causada ao chupar um prego. Podem estar relacionados a essa sensação o tempo de envelhecimento em barris de carvalho; aldeídos formados na fermentação, em cachaças que não passaram por madeira; e as diferentes concentrações metálicas da água usada na produção. Não é uma sensação agradável e em excesso deve ser considerada um defeito.
Cachaças oriundas de fermentação selvagem, com acidez mais acentuada e com destaque para aromas e sabores das famílias vegetais e fermentados. Sensação mais presente em cachaças puras, mas também encontrada em cachaças maturadas em madeiras de forma rústica, geralmente novas, que não passaram por tosta, especialmente amburana.
Sensação desconfortável de calor e aspereza, perceptível durante o exame gustativo e de retrogosto, principalmente na língua e na garganta. A popular expressão “desceu arranhando” traduz uma das manifestações que caracterizam a queimação após o consumo do destilado. A acidez elevada da cachaça é a principal responsável por essa sensação, causada sobretudo por contaminações durante a fermentação.
Descrição usada quando a cachaça apresenta ampla riqueza de notas aromáticas de duas ou mais famílias. Alguns avaliadores caracterizam essas cachaças como mais vibrantes por trazerem principalmente notas florais e frutadas. Ao degustar cachaça, a sensação é perceptível durante as análises olfativa, gustativa e de retrogosto.
Sensação que descreve um buquê mais conservador, de leque sensorial pouco amplo, e pode ser notada em todas as etapas da degustação. Presente em cachaças mais sóbrias, que apresentam notas das famílias torrado e castanha (couro, fumo).
Notada quando há preenchimento de toda a boca e o nariz, com persistência dos aromas e sabores agradáveis por alguns segundos, em especial após a análise de retrogosto. Também provoca aumento da salivação.
Ao degustar cachaça que passa por madeira sentimos as sensações trazidas pela madeira. O envelhecimento promove diminuição significativa da sensação alcoólica e da queimação, contribuindo para outras notas positivas, dependendo principalmente da variedade da madeira, do tamanho do barril e do tempo de repouso. A sensação de amadeirado não é bem-vinda quando acompanhada de adstringência e amargor excessivos e de pouco corpo, percepções ocasionadas quando a madeira é usada para mascarar defeitos resultantes sobretudo de uma fermentação malfeita.
Sensação determinada pela percepção do etanol, principal álcool presente na cachaça. Se excessivo e com aroma enjoativo, pode estar relacionado a álcoois e aldeídos indesejáveis. Avalie se ao degustar cachaça a presença do álcool não agride narinas, boca e garganta e não causa arrepios. Se em equilíbrio, o etanol deve funcionar como veículo de aromas agradáveis e se destaca como uma sensação fundamental para a harmonia da cachaça.
O melhor da cachaça no seu e-mail