Dom João e Casé: os 55 anos de diferença não os impediram de serem grandes sócios da cachaça Maré Alta
A cachaça Maré Alta foi produzida na cidade fluminense de Paraty e deixou um legado na história da cidade, que é um dos berços da cachaça no Brasil.
Em 1805, a indústria da cachaça paratiense já produzia e comercializava mais de 1600 pipas por ano (cada pipa tem em média 490 litros). Produzir aguardente teve tanta importância que o nome da cidade até virou sinônimo de cachaça de qualidade. John Luccock, comerciante inglês, em 1818, anotou que Paraty desfrutava “de considerável comércio com a capital; sua aguardente, acima de tudo, é de grande aceitação”.
Já no século XX, surgiram na cultura popular menções a Paraty como sinônimo de cachaça.
“Em vez de tomar chá com torradas, tomou parati” – “Camisa listrada” (1935), canção escrita pelos irmãos Valença e eternizada na voz de Carmen Miranda
A importância de Paraty como pólo produtor de cachaça fez com que os produtores locais fossem reconhecidos em 10 de julho de 2007 com o selo de Indicação Geográfica (IG) do INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial).
A data de fundação da cachaça Maré Alta é um pouco confusa, pois dizem que a marca foi criada na década de 1970 por um estrangeiro chamado Douglas Reid, conhecido pelos mais antigos da cidade como um dos criadores do Festival da Cachaça de Paraty, evento criado em 1982.
Por volta dos anos de 1990, o príncipe João de Orleans e Bragança, bisneto da Princesa Isabel e muito conhecido na cidade como Dom João, comprou o alambique de Reid e tocou uma produção tímida de cachaça Maré Alta, que era comercializada em uma garrafa de porcelana.
Em 1997, com a produção da Maré Alta já quase parada, Dom João teve uma prosa com o Carlos José Miranda, o Casé, um jovem entusiasmado com a produção artesanal de cachaças e descendente de tradicionais produtores de cachaça, sendo que 3 dos 7 alambiques de Paraty são de parentes.
Neste encontro, o jovem empreendedor apresentou uma cachaça que ele havia elaborado por hobby e Dom João gostou do sabor. Na época, João tinha 82 anos e Casé 27, porém a diferença de idade em nada atrapalhou a parceria que iria se estabelecer com uma sociedade. Casé relembra a proposta que recebeu do príncipe:
“Ele me disse: ‘olha Casé o meu alambique está parado, mas se você quiser fazer essa cachacinha boa lá, nós podemos nos tornar sócios’ e foi aí que nasceu essa sociedade louca de um jovem de 27 com um senhor de 82”, conta com humor Casé.
A sociedade entre Dom João e Casé deu certo e no ano de 1998, o jovem paratiense entrou para dentro do alambique e começou a produzir cachaça em parceria com o Príncipe. Lá ele aprendeu com Jeremias, o mestre alambiqueiro, técnicas de destilação e muito mais sobre os processos de produção de uma boa cachaça. No ano de 1999 foi relançada no mercado uma versão da cachaça Maré Alta, com uma formulação diferente e uma embalagem mais moderna.
A marca contava com dois rótulos: um de cachaça envelhecida que passava por barris de carvalho, e outra de uma cachaça branca, que descansava em madeira de amendoim – que não interfere na cor da bebida.
Casé relembra que as mudanças deram muito mais gás para a marca, que em pouco tempo começou a ser reconhecida pela mídia e especialistas, sendo considerada na época pelo ranking da Revista Playboy uma das 5 melhores cachaças do país. “Era uma cachaça encorpada, bem ao estilo de Paraty mesmo com 46 graus GL”, relembra o produtor.
As garrafas mais modernas de cachaça Maré Alta Prata
Em 2003, Casé resolveu deixar a sociedade para entrar de cabeça na criação de uma outra marca de cachaça feita em parceria com o irmão, Paulo Eduardo Miranda: a Paratiana. Desses 6 anos de experiência de sociedade da Maré Alta, o produtor paratiense levou muito do conhecimento para o novo alambique:
“A Paratiana é uma cachaça bem parecida com a Maré Alta. Eu trouxe para a linha ouro um blend de carvalho inglês e francês e a prata é feita com barris de jequitibá, que interfere pouco na cachaça e tem um perfil muito presente do gosto cana ”, comenta Casé.
A cachaça Maré Alta encerrou as atividades um ano depois da saída de Casé, em 2004, sendo que algumas unidades da aguardente ainda eram vendidas em empórios da cidade e hoje, muito provavelmente, deve figurar em algumas coleções particulares.
Atualmente Casé e o irmão Paulo tocam a produção da Paratiana, um dos 7 alambiques de Paraty em atividade
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